saiba que eu tenho approach

25 fevereiro, 2007

Manhattan

A maneira Woody Alleneriana-neurótica de elogiar uma mulher que eu gostaria de ter dito:

(Indo de táxi para o restaurante)
"Você está tão bonita que eu mal consigo olhar para o taxímetro!"
Em Manhattan, 1979.

19 fevereiro, 2007

Daily Nietzsche

Sempre quis citar Nietzsche periodicamente nos meus blogs; no entanto, só havia espaço para bazófia. Nada que fosse incompatível, porém eu me resguardava de fazer-me parecido com certos autores de blogs que citam suas ladainhas repetidamente e não têm conteúdo próprio. Talvez eu mesmo corra este perigo e não queria deixá-lo cristalizado em citações periódicas, já que posso definir-me como citador compulsivo (de alguns poucos autores); ou apenas ainda não passei da fase das influências. De qualquer forma, ainda é forte o impulso de incorporar no meu sangue as palavras e a força de Nietzsche, vou relendo os livros e publicando suas provocações.

Eis a primeira: O solitário fala (Gaia Ciência, § 364)

A arte de andar com pessoas assenta fundamentalmente na capacidade (que requer longo treino) com que se é capaz de ingerir um repasto cuja cozinha não inspira nenhuma confiança. Caso sentemos à mesa com uma fome de lobo, tudo vai bem (...) Mas não se possui esta voracidade de lobo quando se quer! Ah, como o próximo é duro de digerir!

14 fevereiro, 2007

Quentinha

Tocou a minha campainha uma vizinha, daquelas que nunca aparece a não ser para pedir algum favor. Ao invés disso, bem que poderiam aparecer de vez em quando ofertas de moedas de ouro, oferendas de virgens, coisas simples, mas importantes, que a falta de humanidade das pessoas eliminou da civilização.

— Oi...
— Sim?
— É que a minha vizinha tá passando mal, eu já liguei pro SAMU 192 e eles disseram que não vinham buscar, ela não pode beber, usa remédio controlado...
— Pera que eu vou te dizer o hospital pra onde você vai levá-la.
— Você não vem nem dar uma olhada nela?

Tive que ir. A mulher era horrível estava absolutamente chapada; me ocorreu imaginar como sobreviveram milhões de bêbados nos milênios da humanidade sem o SAMU 192. A mulher que estava inconsciente prontamente acordou (eu ainda acho que os bêbados têm um sexto sentido para a presença de médicos e afins, ou talvez seja a iminência de uma injeção). Começou a falar as baboseiras que primeiro vieram à mente, nomeou sua família até a décima quinta geração antepassada e depois foi me preparar um prato de caruru com vatapá. Eu dispensei as vizinhas desesperadas e comi a refeição que ela me ofereceu, não foi nem uma questão de educação: eu estava faminto mesmo.

Gostei tanto que voltei no outro dia para encomendar o almoço, já que ela fornecia quentinhas.

— Você fornece almoço, não é?
— É. Você é o médico?
— Sou, sim.
— Não vou cobrar de você, muito obrigado por ter vindo ontem!
— Cobre! Eu nem queria vir aqui!
— (Risos) Tá certo. Você come tudo, não é?
— Como!

Ela deu um sorrisinho maroto e eu imediatamente me arrependi de ter feito uma declaração de caráter tão indiscriminadamente generalista. Corrigi no reflexo, mas não sem me arrepender mais ainda:

— Quer dizer, você, não.

12 fevereiro, 2007

Caraívas

Caraívas não é Caraíbas, é bom deixar claro de início.

É uma cidade pequena, mas pode ser achada no mapa (da Bahia, é claro). Fica perto de um povoado chamado Monte Pascoal, um pouco abaixo de Trancoso e um pouco acima de Prado, no litoral sul. Para os que ainda não acharam, Trancoso fica perto de Arraial d'ajuda e de Porto Seguro; e para os que não acharam mesmo assim, sempre existem o Google, a Igreja Universal do Reino de Deus e transplantes de cérebro, não necessariamente nesta ordem de eficiência.

Caraívas é uma penisulazinha entre o rio Caraíva (quem imaginaria?) e o oceano Atlântico, não possui fornecimento regular de energia elétrica e felizmente só é possível chegar lá de barco ou nadando. Como a probabilidade de um pagodeiro conseguir atravessar o rio com um gerador de energia elétrica e caixas de som nas costas é pouco animadora, nem há qualquer acesso para a cidade por terra, você certamente não irá encontrar lá um Chevete modelo 1975 com equipamento de som de 1000 Watts de potência no volume máximo tocando Arrocha ou outro tipo revolucionário de música baiana.



Há atiradores de plantão contra nadadores mal-intencionados que desejem entrar na cidade


Muitos turistas? Sim. Há sempre um pessoal que parece que nunca viu capoeira na vida, aí forma uma roda enorme de gente tirando foto, você sabe como é. Mas é tudo muito tranqüilo, sem muita badalação. Comida boa, restaurantes de frente para o rio, e uma noite maravilhosa com todas as estrelas do céu; você talvez precise de uma lanterna para achar a sua pousada de volta, mas é maravilhosamente aconchegante andar pela rua de areia paralela ao rio entre os barzinhos, restaurantes e lojinhas que põem luminárias por todo o caminho, velas dentro de sacos de papel, e pessoas, na proporção ideal: nem um mudaréu de gente, mas também não é uma ilha de eremitas-hippies que ainda está na década de 70.

Você precisa ver isso à noite


Quer dizer, lá tem até internet! Mas quem precisa de internet em Caraívas? Principalmente porque ela custa R$ 8,00 por hora e só funciona por cerca de 3 horas, já que tudo lá é limitado ao tempo que os geradores de energia, a maioria de fonte solar, podem ficar ligados ininterruptamente. Mas se você é um especulador da Bolsa de Valores e precisa ganhar milhões de reais na última variação das ações da Vale do Rio doce, não é preciso ir à cidade mais próxima para mandar um e-mail para o seu corretor.

Fora isso tudo, ainda tem um pequeno detalhe: praias maravilhosas, água limpíssima e um rio legal pra tomar banho.


Fotos por: Linsmar Dancon

Assim, finalizo com meu conselho pessoal: não vá pra Caraívas, lá é horrível!

11 fevereiro, 2007

Labirinto

Eu não ando viajando muito, mas sempre tive cara-de-pau suficiente pra puxar conversa com os outros no caminho, nos ônibus, nas lanchonetes, onde quer que seja. Nem sempre o papo é bom, mas nas poltronas do lado quase sempre a conversa é de ruim de arrepiar, contando ainda com a generosidade dos interlocutores, que não guardam pra si a má prosa e fazem todos ouvirem.

Mas uma vez eu tive a sorte de encontrar um homem engraçado, mais velho; na época eu tinha uns 12 anos e viajava com meus pais. A gente conversou sobre um monte de coisa, até que ele começou a contar uma estória assim:

"Garoto, você tem cara de que gosta de pensar na vida. Pois eu estou pensando nela há uns 50 anos e criei uma estória pra explicar o que é a nossa vida. Preste atenção: muita gente diz que o mundo é um inferno, outros dizem que é um paraíso, outros que é uma ilusão, outros que é somente dor e sofrimento, e por aí vai. Mas acontece que cada um vê apenas o que seus olhos podem olhar, e geralmente os olhos das pessoas olham sempre para as mesmas coisas, as olham por tanto tempo que não conseguem enxergar mais nada, e por isso elas têm tanta certeza de que estão certas.

Eu, porém, nunca consegui passar tempo demais olhando pra uma coisa só. Não sei, talvez não tenha sido feito pra parar, como disse Raul Seixas, 'como as pedras imóveis na praia'. Nunca tive objetivo na vida, e tive até muita sorte, pois sem o menor esforço eu tive mais oportunidade que a maioria das pessoas têm. Mas enquanto todos tinham um objetivo e acabavam parando quando o encontravam, eu continuava caminhando, sem saber o que fazer direito, e todos ficavam para trás. As pessoas não te perdoam por isso, acham que você é ingrato ou arrogante, logo eu, que nunca tive nada para provocar ressentimento em ninguém... Nunca fui importante ou famoso, nem ostentava qualquer tipo de coisa que desse inveja. Mas as pessoas simplesmente não gostam de ser deixadas para trás, principalmente se for por alguém como eu. Eu nunca pude evitar, pois, fatalmente, todo mundo acaba se dando por satisfeito na vida, seja com uma esposa, filhos ou a profissão miserável; uns são mais modestos e querem apenas ter um carro para adorar para o resto da vida. Outros não se encontram em nada disso e acham a igreja. Mas eles todos, se gostam um pouco de você, nunca te perdoarão se você continuar caminhando. É uma má lembrança, perceber que está parado.

Mas todos os andarilhos, como eu, um dia se perguntam se realmente haverá um lugar onde chegar. Porque eu não ando para deixar os outros para trás, e sim para chegar no meu lugar, e tomara que haja alguém lá além de mim, ou pelo menos alguém que caminhe comigo por um tempo. A vida vai passando, a gente vai sempre olhando pra frente, e quando dá de olhar para trás, eta que já foi um monte de tempo!, já passou um monte de coisa, já conhecemos tanta gente que nem dava pra lembrar direito...

Foi aí que eu comecei a dizer que a vida é um labirinto. Todos procuram uma saída, e muitos encontram, mas o que a maioria não vê é que nenhuma delas é uma saída de verdade. É como se cada uma fosse um oásis no meio do labirinto. Para uma grande parte das pessoas, a saída é ter um emprego fixo, uma casa, mulher e filhos, amigos e família. Outros se encontram na religião e em Deus. Eles encontram um recanto mais agradável no labirinto e lá fixam sua morada, para que possam descansar da vida dura. No geral, quase todos olham para os lados e se compadecem do seu semelhante, que lhes parece um errante infeliz e faz sempre as escolhas erradas. Mas há tantas saídas quanto há pessoas, e o labirinto é cheio desses "oásis" e dos seus ocupantes. Ninguém vê, no entanto, que se cada um tem a sua solução como a única certa, as soluções mutuamente exclusivas acabam excluindo-se umas às outras até não sobrar nenhuma (confesso que nesse ponto eu precisei um pouco mais de raciocínio pra continuar entendendo, depois descobri que o homem era um matemático e gostava desses golpes de lógica). Sabe como é? Você anda entre paredes estreitas, e aí acha uma praia enorme, que parece sem fim! A tendência é acreditar que enfim achou o que queria, mas, se você é um pouquinho mais curioso, começa a explorar os limites da sua praia e acaba como o personagem daquele filme que navegou no mar até bater numa parede pintada de horizonte. Você pula o muro e acaba dentro do labirinto de novo.

Bom, eu pulei tantos desses muros que não acredito que o labirinto tenha fim. Quando eu tinha um pouco mais que a sua idade, ainda acreditava que chegaria a um lugar, esperava que fosse um lugar fantástico, onde ninguém tivesse chegado antes, ou no mínimo um lugar que não fosse de mentira, que não fosse um paraíso artificial no meio do labirinto. Isso vem muito do narcisismo, muita vaidade, e o tempo vai varrendo isso da gente, inevitavelmente. Com o tempo, a possibilidade de nada ser verdadeiro anula as questões contra a mentira, torna o conceito de ilusão inaplicável e transforma a busca da verdade num caminho ridículo e infantil como todos os outros, se não mais. Porém, em certa altura do caminho não há mais como mudar; nunca vai tudo embora, e apesar de achar que o labirinto é infinito, toma tudo e ninguém jamais conseguirá sair dele, eu sempre me surpreendo olhando para o horizonte procurando uma saída, um final... Visito, de quando em vez, meus amigos de infância nos seus oásis, mas sou sempre um estrangeiro entre eles, um viajante que some de repente sem deixar rastros, um alienado e louco que está sempre com a poeira do deserto nos cabelos..."

08 fevereiro, 2007

Post infame de inauguração

  1. Este é um blog de ficção, que na realidade não existe e ninguém viu, caso alguém pergunte.
  2. Este é um blog expressamente incomunitário, inimputável, ilegível, indinheirado e inguinorante.
  3. Neste blog não se mencionará palavras ambíguas com dois, três ou até mesmo um só sentido.
  4. Me reservo ao direito de não observar quaisquer dos aspectos precedentes.